terça-feira, 29 de junho de 2010

[À Descoberta de Carrazeda de Ansiães] À Descoberta de Mogo de Malta (1ª parte)

São muitos os que, como eu, passam dezenas, centenas de vezes pela Estrada Nacional 214, atravessando Mogo de Ansiães, sem fazerem um pequeno desvio para conhecer a freguesia de Mogo de Malta. No dia 17 de Abril decidi quebrar esta rotina e segui directamente para Mogo de Malta, na tentativa de visitar os seus pontos de interesse, falar com os seus habitantes e Descobrir um pouco da sua história e das suas belezas.
A ideia de existirem dois Mogos, lado a lado, mas integrando freguesias diferentes, sempre me intrigou. Esse era um dos desafios que pretendia desvendar. A minha preocupação quando deixei a estrada nacional e segui pela rua Dr. João Trigo Moutinho foi a de tentar descobrir quando entraria no termo de Mogo de Malta. Imaginei que a linha divisória deveria estar muito próxima do primeiro ponto onde parei o carro, mas não encontrei ninguém que me ajudasse a esclarecer o enigma.
 Continuei pela mesma rua até encontrar umas Alminhas que motivaram mais uma paragem e as primeiras fotografias. Estas alminhas já têm um painel de azulejo monocromático representando o purgatório de onde se ergue uma cruz com Cristo crucificado. Este painel deve ter sido colocado uma época bastante posterior à edificação das alminhas que devem ter tido, numa primeira fase, um painel em madeira, embutido no mesmo lugar onde está o azulejo. Perto destas alminhas é possível encontrar, também na berma da estrada, uma fonte muito antiga, a que se tem acesso descendo por estreitas escadas em pedra. É conhecida pelo nome de Fonte da Mina.
outro caminho, este mais largo, que permitia o acesso a vários terrenos. Continuei por ele, desta vez em direcção à Escola Primária. O caminho largo terminou de repente e continuei por outro carreiro com cerca de meio metro de largura, com parede de um lado e do outro, que me levou à Av. Santa Catarina. De carro nunca me teria apercebido destes caminhos que me permitiram ver Mogo de Malta de uma nova perspectiva. Já na avenida, próximo da Junta de Freguesia, segui à procura de evidências da delimitação da mesma. Recordei um documento de 1859 que dizia que os dois Mogos estavam à distância de 100 metros um do outro, com a igreja de Santa Catarina a meio. Parei perto da Eira da Santa. Alguns residentes mostraram-me, perto da igreja, uma cruz encarnada pintada na estrada, marco actual da longínqua história destes povoados. E foi ao ver esta cruz que a minha memória voou pelo Vale da Cabreira, passou sobre o Pé-de-Cabrito, formação rochosa das mais curiosas que existem no concelho, e continuou em direcção a Folgares, seguindo para Pereiros, até ao Rio Tua. É nesta linha divisória que reside o verdadeiro significado da designação "de Malta". Os concelhos primitivos de Ansiães e Santa Cruz da Vilariça deram lugar a outros, como por exemplo ao de Freixiel e ao de Vilarinho da Castanheira. Mogo de Malta tem a sua história ligada ao concelho de Freixiel, criado no séc. XII. Já anteriormente, D. Teresa, casada com D. Henrique de Borgonha, tinha doado Freixiel à Ordem de S. João de Jerusalém, também conhecidos por Hospitalários ou simplesmente Ordem de Malta. No momento da criação do concelho de Freixiel, Mogo, juntamente com Pereiros (e Codeçais), ficaram a pertencer-lhe. É possível que muitas das marcações ainda existentes sejam já dessa altura, mas outras foram feitas de novo ou avivadas em 1728. Desde Alagoa, passando junto à Igreja de Santa Catarina, continuando pelo Pé-de-Cabrito, seguindo depois a estrada para Folgares, descendo por Vale Covo, etc. é possível encontrar um vasto conjunto de cruzes gravadas nas rochas que delimitavam o território administrado pela Ordem de Malta em relação ao de Ansiães.
Actualmente há histórias bem curiosas sobre as casas situadas nesta zona de separação entre os dois Mogos: diz-se que há quem coma num Mogo e vá dormir a outro, mesmo sem sair de casa!

 A igreja de Santa Catarina estava ali perto por isso decidi visitá-la. Eis o que dela se dizia em 1758: "O orago é de Santa Catarina, tem três altares estando a Santa no do meio. Não tem o Santíssimo Sacramento. No altar da parte Sul está a Senhora do Rosário e no do Norte está um Santo Cristo que não haverá três anos, pouco mais ou menos, que dizem que faz milagres". Já em 1766 dizia-se: " a igreja tinha de nascente a poente e de comprimento sete varas e meia e de largo quatro varas e meia, estando a ser acabada de novo, com sacristia nova e capela-mor. O altar-mor, sem sacrário, onde está a imagem da padroeira, Santa Catarina, que está muito velha, tem dois altares colaterais, com a imagem de nossa senhora do rosário e no outro o Senhor crucificado".
A igreja forma com o adro, o cemitério e uma pequena capela que ostenta, na porta em ferro forjado, as iniciais ATM e a era de 1898, um conjunto muito agradável à vista, com o granito à mostra. A nascente, nas traseiras da igreja, está em construção um novo edifício, igualmente em granito, que poderá ser uma estrutura de apoio.
Quando se entra não se pode deixar de reparar que é um templo pequeno, mas bonito e muito bem cuidado. Quase deu para reconhecer algumas das imagens de que falava o relato do séc. XVIII, mas há novas imagens e os altares estão em muito bom estado de conservação. O que despertou mais a minha atenção foram as bonitas pinturas, recentes, que decoram o tecto da capela-mor.

Saí da igreja e segui pela avenida mais espaçosa da freguesia. Aqui se encontra o edifício da Junta de Freguesia, um campo polidesportivo, a antiga Escola Primária, agora transformada em museu, e a "nova" Escola Primária, já sem a alegria das crianças do 1.ºCiclo mas ainda frequentada por um grupo do Pré-escolar.
Logo a seguir, à esquerda, a Av. Francisco Bernardo conduz ao Centro Social Paroquial de Mogos e ao Santuário de Nossa Senhora da Saúde. À direita há um minimercado e bar. A avenida termina no lugar mais espaçoso da aldeia, a Praça da Ordem de Malta, que agora tem um fontenário no centro. Decidi ir recuperar o carro, que abandonei logo quando cheguei. Para isso virei à direita pela rua Dr. João Trigo Moutinho, mais conhecida como Rua do Cimo do Povo. É nesta rua ladeada de casas humildes, com escadas exteriores em granito e varandas típicas, que se destaca uma casa, quer pelo volume e qualidade de construção, quer pelo jardim anexo. Trata-se da casa da família Pimentel. Nela podemos encontrar duas curiosidades que os habitantes de Mogo de Malta gostam de mostrar: um bonito relógio de sol em granito, encimando um largo portal lateral, também em pedra e o "Mogo". A tradição popular não atribui a palavra Mogo à divisão ou extremo, mas sim a uma cabeça esculpida num bloco de granito que deve ter servido de sustentáculo ao corrimão da escada de entrada. Esta personificação da freguesia é bastante frequente e conheço situações idênticas em Zedes e Pereiros. Não deixa de ser curioso, e ainda não vi isto escrito em lado nenhum, o facto de logo abaixo da cabeça humana se encontrar, também gravada em alto-relevo, a cruz da Ordem de Malta. Este facto vai reforçar ainda mais a simbologia de que aquela cabeça representa realmente um habitante de Mogo de Malta.


João Inácio Teixeira Meneses Pimentel nascido em Mogo de Malta em 1859 foi uma figura ilustre. Engenheiro agrónomo, dirigiu a Estação Transmontana de Fomento Agrícola e foi cavaleiro da Ordem de S. Tiago.

Continua:
À Descoberta de Mogo de Malta (2ª parte)
Fontes históricas: Morais, Cristiano; (1995); Estudos Monográficos Vila Flor - Freixiel

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Publicada por Xo_oX em À Descoberta de Carrazeda de Ansiães a 6/09/2010 12:15:00 AM

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