O mês de maio já se assumiu há muito como o mês do coração, por isso as caminhadas são frequentes por todo o lado, criando o hábito e o gosto por caminhar, aliado ao convívio, contacto com a natureza e até oportunidades gastronómicas interessantes.
Mesmo sem grande publicidade ao evento a ARCPA conseguiu juntar perto de uma centena de pessoas prontas para percorrerem mais de uma dezena de quilómetros numa freguesia em que a possibilidade de traçar percursos planos é muito reduzida.
Tal como comentei durante a caminhada, é possível que a organização tenha escolhido os melhores percursos da 1.ª e na 2.ª edição, mas, nesta altura do ano haverá algum caminho que não seja agradável de percorrer?
A concentração aconteceu às nove horas junto à sede da Associação, tendo o caminhada iniciado poucos minutos depois. Percorridas a rua da Escola, a rua da Capela e a rua do Concelho o trajeto afastou-se da aldeia pela tão famosa calçada romana. Esta calçada de cronologia indeterminada, mesmo não sendo romana, não deixa de ser local interessante para visitar, tal como as restantes calçadas existentes no concelho. Não sei se repararam, mas junto da ribeira há um marco com a data de1851.
Quando chegámos à estrada EN314-1 pensava que iríamos em direção a Paradela, mas junto à ribeira do Frarigo mudámos de direção começando a subir uma encosta íngreme com vinha.
O tempo estava muito instável, com frio e ameaças de chuva a qualquer instante. Se por um lado não havia calor, por outro o ar encontrava-se saturado de água, o que também não é propriamente agradável para a respiração. Mas o grupo seguia animado, começando a fracionar-se consoante a velocidade adequada a cada um. Escusado será dizer que rapidamente fiquei na cauda do pelotão! Além de tentar fotografar os participantes, não queria desperdiçar este percurso sem registar as belas paisagens e, se possível, alguns exemplares interessantes da flora ou formações rochosas. Como não fazia ideia do percurso, não sabia o que viria a seguir.
Consegui algumas fotografias panorâmicas do Pombal. Há anos que não o via assim. Depois de encontrar o caminho de terra batida que une Pombal a Areias, senti-me de novo orientado, em terrenos que já conhecia.
O percurso desenvolveu-se numa zona de pouco declive, paralelamente à ribeira que desce do Pinhal, contrastando com os picos quartizíticos do Seixigal. A capela de Santa Marinha anunciou-me de novo território conhecido. Há pouco mais de ano que andei por ali num largo passeio pelos locais interessantes de Pinhal do Norte. Um pouco mais adiante, depois de passar sob a estrada vi à direita a Senhora dos Aflitos, mas não tive tempo para lhe fazer uma visita. Seguia nesta altura completamente sozinho, com o grosso do grupo já distante, à minha frente, e um pequeno grupo, também distante, atrás de mim. Pensei que o reforço seria no centro do Pinhal, ali pelo largo do Terreiro, com tantas coisas interessantes para rever, mas não aconteceu.
As ruas do Pinhal estavam cheias de rosas, rosa, mas principalmente vermelhas. Apeteceu-me afrouxar o passo, consolar-me com a beleza das imagens, ou com o sabor das cerejas maduras que já espreitavam das cerdeiras. A aldeia parecia meia adormecida, muitos idosos foram nesse dia em passeio a Salamanca, onde foi também a minha mãe.
Depois de deixar as últimas casas de adivinhei a descida para o vale do Tua. Entusiasmava-me a ideia. Depois de tantas vezes palmilhar o fundo do vale, ao longo da linha, ia conhece-lo de cima, de um ângulo completamente novo. À direita, mesmo sem ninguém para mo confirmar, percebi que havia um cabeço que seria o Castelo ou Castelejo. Neste morro granítico existem vestígios de um povoado da Idade do Ferro.
Absorto na paisagem que se estendia do Castelejo até ao outro lado do rio onde se exibia Franzilhal, quase tropecei no grupo que já se deliciava com um apetecido e apetecível reforço.
A mesa estava farta, capaz de abrir o apetite ao mais fiel cumpridor de dietas. Desde presunto, chouriço, torresmos, rissóis, bola de carne, marmelada, fruta, água, sumo e... querem ver que se esqueceram do vinho?! E esqueceram mesmo. A verdade é que não fez falta e o percurso que seguimos era tão inclinado e escorregadio que qualquer copito de tinto (com o grau habitual do Pombal), teria dificultado as coisas.
Saciada a gula, mais do que a fome que era pouca, o caminho seguiu por entre vinhas até atingir a Linha do Tua, perto da foz da Ribeira das Loiras. Conheço cada curva do rio e imaginei o apeadeiro do Tralhão, escondido atrás de uma ravina mais saliente.
Rio e linha fazem um acentuada curva respeitando os caprichos da natureza. Este lugar, de nome Ferrado, parece distante de tudo o que é civilização, mas há muito que foi explorado pelo homem como o provam os restos de tégulas que os romanos por aqui deixaram espalhadas.
Entre momentos de sol abrasador e grossas gotas de chuva que teimavam e refrescar-nos a fronte, fomo-nos aproximando da linha. Nessa altura já eu seguia acompanhado por alguns caminhantes do Pombal que me confessaram terem tomado imensos banhos no Tua, no local com o nome de Poço Chorido. Deve ali ter existido em tempos uma azenha. O açude e o próprio leito rochoso do rio criaram uma represa que fazia as delícias da garotada no pico do verão.
O percurso ao longo da linha tinha aproximadamente 2 quilómetros. Aqui não são as vistas largas que enchem os olhos mas é a harmonia, o abandono, o domínio da rocha e da água, a sensação de que a natureza nos acolhe no seu recanto mais íntimo e nos enche paz, de tempo até para esquecer o tempo, porque o que é bom é para ser vivido devagar.
As casas de S. Lourenço, ou o que resta delas, tornaram-se visíveis. Da estação subimos às termas onde o tempo parece ter parado. Um grupo de pessoas continuava à espera da sua vez para um banho cálido e revigorante; à porta do pequeno soto assomou a mesma cara, com os mesmo óculos, como se o tempo tivesse parado há décadas atrás; só as ruínas estão mais ruínas porque os pinheiros altos e vigilantes nas casas cimeiras continuam lá, testemunhando as histórias que talvez um dias as águas serenas da barragem venham a submergir.
A caminha terminou no caldas de S. Lourenço. O autocarro da câmara transportou os participantes para a sede da ACRPA, onde iria ser servido o almoço. Para não ficar à espera, eu e mais algumas pessoas, fomos subindo a encosta a pé. Tanto subimos que acabámos por fazer todo o percurso até ao Pombal.
O almoço foi preparado pela Associação à base de carne, sardinhas assadas e arroz branco. O salão transformou-se numa enorme sala de restaurante onde nada foi colocado ao acaso. As saladas, as frutas, os próprios talheres foram colocados nas mesas com gosto, próprio de quem tem prazer naquilo que faz.
Como já é habitual, para comer aparecem sempre mais uns quantos. Não consegui perceber se também havia inscrições só para o almoço, mas penso que sim. Almoçaram mais de uma centena de pessoas, sem pressas, num ambiente alegre e de amizade. Não faltou o tão afamado vinho do Pombal, de consumo mas também tratado, tão velho que parecia licor. Terminado o repasto, tomámos um café no bar da Associação e demos por terminada a missão que nos levou ao Pombal.
Em jeito de balanço só posso dar os parabéns à organização.O percurso foi interessante e diversificado; a marcação estava exemplar, poucas vezes vi um trabalho tão bem executado; o reforço e o almoço estiveram para além de todas as expectativas. O grupo de caminheiros, esse então é sensacional. A maior parte tem-se encontrado nas caminhadas pelo conselho organizadas pela Câmara Municipal. Quanto às gentes do Pombal em geral e aos corpos gerentes da ACRPA em especial, a sua disponibilidade e simpatia são o melhor que a aldeia tem para oferecer e fizeram-nos sentir em casa. Só tenho pena de ter perdido as duas primeiras edições.
Mais fotografias:
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Publicada por Blogger em À Descoberta de Carrazeda de Ansiães a 5/26/2012 08:00:00 AM
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