No dia 15 de outubro o desafio foi uma caminhada entre Vila Flor e Folgares, em mais uma Peregrinação, tendo como destino a capela de S. Luís, na pequena aldeia de Folgares. Este trajeto já tinha sido feito numa caminhada que realizei em novembro de 2008, quase na mesma altura do ano. Nessa altura fiquei entusiasmado com alguns trilhos que encontrei, escavados na rocha granítica. Voltar ao vale da Cabreira à procura dos mesmos trilhos foi quase como procurar uma agulha num palheiro, mas valia a pena tentar.
As dificuldades deste trajeto são várias. Uma, bastante preocupante ter a ver com os cães dos pastores, que, certamente, estariam a guardar as cortes existentes entre Samões e Freixiel. Outra dificuldade é encontrar o caminho certo no vale da Cabreira. É uma zona agreste como poucas no concelho e sem todos os caminhos têm seguimento. A terceira dificuldade é o traçado da encosta do vale com uma inclinação tão acentuada que causa dores só de pensar em subi-la. Para piorar as coisas, a maior dificuldade está no final do percurso, quando o cansaço já é muito. Estas dificuldades não são motivo para desânimo, antes pelo contrário. As dificuldades foram um incentivo a começar a caminhada bastante cedo, ainda o sol não tinha surgido no horizonte.
O dia estava quente e a progressão foi rápida. Depois de termos deixado Samões para trás, o trajeto até Freixiel já foi percorrido muitas vezes, não havendo dificuldades de orientação. Os cães pastores lá estavam, onde eram esperados, mas pareciam meios adormecidos àquela hora do dia. Felizmente para nós...
Em Freixiel ainda tivemos tempo para subir à Forca, visitar a igreja matriz, a fonte romana e o Pelourinho. Casa um destes elementos seria motivo para se gastar algum tempo na sua admiração, mas não havia tempo a perder.
Mesmo não sendo o trajeto mais lógico, subimos ao santuário de Nossa Senhora do Rosário. Este foi o destino da nossa Peregrinação de 17 de outubro de 2010, mas também é um ótimo miradouro para a aldeia e um bom ponto de partida para entrar no vale. No recinto ainda havia lixo. Terminada a festa de verão parece que ninguém se preocupa em limpar o que ficou do fogo da artifício, mas, este espetáculo não é agradável.
Apanhado o caminho em direção ao coração do vale surpreenderam-nos na beira do caminho algumas inscrições nas pedras do muro. Não foi a primeira vez que por ali passei, mas nunca tinha reparado nessas inscrições. São várias pedras gravadas, onde se vê claramente várias cruzes e o ano de 1891. Serão marcas do local do falecimento de alguém? É possível.
O caminho seguido não era muito íngreme. O mais incomodativo era o pó, de alguns centímetros de espessura, mais parecendo farinha! Mesmo sem subir muito, o cansaço não demorou em chegar. Encontrámos uma pessoas que regressava a casa e que nos deu algumas orientações sobre o percurso a seguir. Afastámo-nos do percurso que tinha feito em 2008 e começámos a ter algumas dúvidas se estávamos a caminhar na direção certa. A subida começou a tornar-se mais difícil obrigando a paragens frequentes. O coração parecia querer saltar pela boca e começámos a racionar a água disponível. Por várias vezes hesitámos e mudámos de direção. Sabíamos que Folgares é no alto da encosta e só havia uma direção possível, a que subia.
Pelo caminho fomos encontrado uma série de rochas curiosas. Aliás o vale da Cabreira está repleto de obras de arte naturais juntamente uma grande quantidade de fornos de secar figos.
Nunca saímos do caminho. Em locais como este não se pode andar ao acaso. E foi na berma do caminho, quase sem querer que me pareceu ver o começo de um dos tais trilhos que tanto queria encontrar. De um dos lados do caminho o trilho descia em direção ao vale, do outro subia pela encosta, contornando as rochas, em direção, supostamente, a Folgares. O entusiasmo foi muito e decidimos seguir o trilho. Escavado no granito por séculos de rudes botas e pelas ferraduras dos cascos dos animais, serpentava encosta acima, apresentando nalguns pontos mais de 20 cm de profundidade!
Subindo o trilho encontrámos um idoso. Regressava no seu lento passo à aldeia e fizemos-lhe companhia.
A hora já ia adiantada e não havia tempo sequer para um curto passeio pela aldeia. Enquanto procurávamos por alguém que nos facultasse a entrada na pequena capela de S. Luís, encontrámos uma senhora a fazer pão.
Falámos com 4 ou 5 pessoas, a quem colocámos algumas perguntas sobre a capela e as lendas a ela ligadas. A capela fica no centro da aldeia. Os documentos dizem que outrora foi capela de S. Gens, pelo menos até ao séc. XIX. Cristiano Morais na sua monografia sobre a Freixiel publicada em 1995, refere-se a esta capela em diversos pontos. Em 1744 a capela estava num estado deplorável, não sendo possível aí celebrar. Foram indicados dois moradores para que no prazo de dois meses a mandassem caiar e rebocar e procedessem às necessárias obras para aí poderem ser administrados os sacramentos. Já a quando da visita do comendador Frei Dom José Telles, em 1766, tinha um "retábulo dourado cuja pintura e douradura se acham renovados". As imagens destacadas eram a de S. Gens, padroeiro, e a de Santa Bárbara. A mudança para a devoção de S. Luís deve ter ocorrido nos finais do séc. XIX ou inícios do Séc. XX.
Na mesma obra ficamos a conhecer a lenda da Cerejeira de S. Gens. Junto da capela havia uma cerejeira que tinha dois ramos a caírem sobre a capela. Produzia frutos em junho à exceção dos dois ramos, que apresentavam frutos maduros exatamente dia 25 de Agosto, no dia de S. Gens! Quem comesse as cerejas dos ditos ramos antes dessa data era atormentado por fortes maleitas, mas quem as comesse depois ficava curado de qualquer mal que padecesse.
As pessoas da aldeia conhecem vagamente esta crença, narrada em "Memórias de Ansiães", mas não têm memória de nenhuma cerejeira. No adro da pequena capela não vi nenhuma árvore de fruto, mas havia junto da porta um tomateiro que ostentava dois enormes tomates!
A capela foi recentemente restaurada. O interior está impecável, em todos os aspetos e o exterior tem as pedras de granito lavadas, depois de estarem durante anos caiadas de branco.
Depois da visita à capela restabelecemos as forças junto à fonte, próxima dali. Regressámos a Vila Flor de carro, pela estreita estrada que liga a sede de freguesia, Freixiel, a esta antiga quinta, Folgares.
Foi uma caminhada memorável, mas, percorrer o vale da Cabreira no sentido contrário ao da ribeira com o mesmo nome, talvez subir ao Pé-de-cabrito é um desafio que ainda ficará para outra altura.
Diferenças de Altitudes
Percurso:16,12 km
Diferenças de Altitudes: 398 Meter (Altitude desde 331 Meter para 729 Meter)
Subida acumulada: 546 Meter
Descida acumulada: 410 Meter
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Publicada por Anibal G. em À Descoberta de Vila Flor a 1/10/2012 07:44:00 AM
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